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terça-feira, 24 de abril de 2012

Carlos Rios


Na impossibilidade de conseguir um vídeo da cerimónia de 1968, escolhi um do ano anterior

No rascunho do post que intitulei “O Acidente (Conclusão)”, incluí dois parágrafos, em que me referia a um camarada em recuperação no Anexo do Hospital Militar, que me tinha impressionado particularmente, quer pelos motivos que o “atiraram” para ali, quer pela forma positiva e bem humorada como parecia superar um “calvário” que provocaria em muitos outros uma profunda depressão.

Depois de reler o que tinha escrito, concluí que o texto estava demasiado extenso (li, algures, que há estudos que concluem que a maioria dos que visitam blogues, gostam de textos curtos), pelo que resolvi retirar os parágrafos relativos ao Carlos Rios, sem, todavia, desistir de voltar ao tema.

É o que faço hoje, regressando ao assunto de forma um pouco mais exaustiva, relativamente, ao que tinha escrito então.

No post acima mencionado referi, de modo genérico, as mazelas de que todos sofriam, embora em diferentes graus. Ninguém se queixava muito, nem, talvez por uma peculiar forma de defesa, era hábito falar, e muito menos aprofundar, as circunstâncias em que cada um tinha ganho as suas “feridas”, algumas para o resto da vida.

Do Rios, soube, quando cheguei ao Anexo de Campolide, em Março de 1967, que tinha ficado gravemente ferido em combate, na Guiné, mas sem quaisquer pormenores adicionais. Era mais um, e, apesar das notórias dificuldades físicas – andava com o auxílio de canadianas e não conseguia dobrar a cintura, pelo que se, por exemplo, se desatasse um atacador dos sapatos, precisava de ajuda – não me parecia um caso tão grave como os de muitos outros internados.

Em 1968, já eu tinha passado à disponibilidade há alguns meses, estando a assistir à transmissão das cerimónias do 10 de Junho, na Praça do Comércio, ouço, com surpresa, o locutor anunciar que o furriel-miliciano Carlos Luís Martins Rios ia ser condecorado com a Cruz de Guerra de 1ª classe, por feitos heróicos em combate. E lá estava ele, a receber a condecoração.

Parecia-me inacreditável, que, estando durante quase um ano todos os dias juntos, saindo do Anexo de Campolide às 14 horas, e continuando o grupo de que ambos fazíamos parte a conviver durante a tarde, ora nas sessões cinematográficas, ora no salão de bilhar do antigo Café Martinho, ele não nos tivesse dito uma palavra sobre a condecoração.

No dia seguinte liguei para o Anexo tentando falar com ele, mas não o apanhei. Porém, um dos camaradas contou-me a saga do Rios, que vim a confirmar mais tarde, com outro companheiro desses tempos.

No decorrer de uma patrulha, ao aproximarem-se de uma tabanca, o Rios avistou um elemento em fuga, pelo que, sem sequer pensar, correu em sua perseguição, não contando com uma emboscada ardilosamente montada pelas forças inimigas, que, disparando diversas rajadas, o atingiram, provocando-lhe uma perfuração no ventre, e destruindo-lhe alguns ossos da bacia.

Ferido com gravidade foi transportado num helicóptero para o Hospital em Bissau, onde, apesar de um diagnóstico pessimista, foi possível estabilizá-lo, e recuperá-lo de forma a permitir a sua evacuação para Lisboa.

Tendo resolvido escrever um texto mais elaborado, fiz algumas pesquisas sobre o Rios. Fiquei a saber que em virtude das muitas intervenções cirúrgicas a que foi submetido, continuou no Anexo de Campolide, e mais tarde no Depósito de Indisponíveis, no Largo da Graça – às vezes em condições humilhantes, segundo ele próprio diz – até 1972.

E, hoje, em vez do jovem, aparentemente bem disposto e sempre com uma oportuna piada na ponta da língua, capaz de pôr uma plateia a rir, com um comentário a uma cena de um qualquer filme, sei de um homem aparentemente amargurado, “surdo e coxo”, como ele próprio se classifica num comentário que fez, neste blogue.

sexta-feira, 6 de abril de 2012

Fotos do Mário Abreu


O furriel-miliciano Mário Abreu, que me enviou as fotos que podem ver mais abaixo, além de ter a especialidade de atirador, fez, no quartel de Lamego, o Curso de Operações Especiais. Os camaradas que completavam este curso – cuja dureza levava muitos dos convocados para as provas de selecção a fazer “ronha” (falo por experiência própria) – eram habitualmente chamados “rangers”, porque a instrução naquele quartel era baseada na dos militares americanos pertencentes a uma unidade especializada, que tinha aquela denominação.

O Abreu comandava uma secção do 3º pelotão (em zona de conflito, como era o caso de Lucunga, os pelotões adoptavam a designação de “grupos de combate”).


(Clique nas fotos para aumentar)

Nesta fotografia, embora a maior parte dos rostos me seja familiar, apenas consigo identificar dois: o Abreu, que tem o braço apoiado no ombro do Eusébio, que é o único com uma camisa de caqui.

O Eusébio era um transmontano que chegou ao RAL 1, onde se formou o Batalhão de Artilharia 741, com fama de ser um valentão com mau feitio, fama que acabou por criar alguns mitos.

Ainda no último convívio, em Fátima, um dos camaradas dizia numa roda onde eu estava : “lembram-se do Eusébio, do 3º pelotão, ter andado à pancada com o capitão Rubi Marques?”

Avivei-lhe a memória, lembrando que ninguém andara à pancada com o capitão Rubi Marques, recordando, como faço agora, o episódio a que se referia.

Logo nos primeiros dias de instrução operacional, durante uma acção num terreno lavrado, próximo do quartel, foi dada ordem para rastejar num determinado percurso.

O Eusébio, que era de facto um bocado fanfarrão e conflituoso, recalcitrou, afirmando que naquele terreno quem não rastejava era ele. Devia vir mal habituado da recruta, feita em Aveiro.

O capitão Rubi Marques, que o tinha ouvido, aproximou-se e, depois de lhe massajar o rosto de forma muito persuasiva, fê-lo compreender, ao que parece definitivamente, que na CArt 738 não havia lugar para tropa fandanga, pelo que, dada uma ordem, não havia margem para discussão.

E o incidente ficou por ali, com o Eusébio a rastejar como os outros.



Na falta de uma ponte, que viria a ser construida no início da década de 1970, atravessávamos o rio Coji nesta jangada.

Além do condutor do Unimog, que me parece ser o Francisco Tavares, mais conhecido por Marova, só me lembro do nome do Abreu, que se encontra de pé, com um rádio portátil na mão.



Um outro aspecto da travessia do rio, aqui com um ângulo mais aberto. À esquerda, dois camaradas dão à manivela que vai enrolando o cabo que, fixo nas margens, movimenta a jangada.



Na Ilha de Luanda, em Fevereiro de 1966, durante o fim-de-semana em que lá ficámos, em trânsito do Norte de Angola para o Quanza-Sul. Também aqui não me lembro do nome do furriel-miliciano da CArt 740, que está à esquerda. Eu estou ao centro, e à direita está o Mário Abreu.



No ribeiro onde enchiamos os tambores para abastecimento de água ao quartel, em Lucunga, aproveitávamos para nos refrescarmos.

A partir da esquerda: o Miranda Dias, o Morais Soares, o Mário Abreu e o António Sousa.




Passeando na picada junto ao quartel em Lucunga, o Vaz, o Mourão (de cachimbo, que estava na moda, em Lucunga. Eu ainda tenho o meu, embora não fume há mais de 30 anos), o Sousa, o Miranda e o Abreu.

As camisolas da farda que o Mourão e o Miranda tinham vestidas são sinal de que devíamos estar na época do cacimbo.